A Constituição e a Propriedade Industrial

Postado por Camelier Advogados Associados
12 de novembro de 2018

1.Introdução

Completamos em 5 de outubro de 2018, trinta anos da nossa última Carta Magna, considerada por Ulysses Guimarães a Constituição Cidadã, pois resgatou os princípios e direitos individuais usurpados no período de exceção, fortalecendo os direitos sociais, políticos e econômicos.

A Constituição Federal de 1988 é vítima da prolixidade “, asseverou Almir Pazzianotto Pinto, Ex-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

De fato, se comparada com a Constituição dos Estados Unidos da América, a nossa é prolixa, pois desce a detalhes enquanto aquela apenas elenca princípios.

A Constituição norte-americana foi assinada em setembro de 1787, ratificada em 1788, entrando em vigor no ano seguinte, 1789.

Ela tem, hoje, apenas 7 artigos e 27 emendas, a maioria delas visando conferir para os seus cidadãos, garantias aos direitos civis e liberdade individual.

Seguindo os ventos da liberdade, por influência da independência norte-americana em 1776, e sua posterior constituição, os países da América Latina, incluindo o Brasil, lograram, nas primeiras décadas do século XIX, suas respectivas independências e, como corolário, suas primeiras constituições, imperiais ou republicanas.

A brasileira veio logo após a declaração de independência de Portugal, em 1824, que fora outorgada pelo Imperador, Dom Pedro I.

Importante ressaltar que os ventos de liberdade foram impulsionados pela maçonaria europeia que influenciou maçons latino americanos, tais como: San Martin (Argentina), José Marti (Cuba), Simon Bolívar (Venezuela) e os brasileiros, entre tantos, José Bonifácio de Andrade e Silva e Joaquim Gonçalves Ledo.

Os ilustre brasileiros acima citados, eram cidadãos do mundo à época, pois estudaram na Europa e mantinham intenso intercâmbio cultural com integrantes da maçonaria francesa, inglesa, escocesa e, claro, portuguesa, ocasião em que fora inoculado o vírus dos ideais maçônicos de então: liberdade, igualdade e fraternidade.

Os maçons colonos norte-americanos tiveram, igualmente, papel preponderante na independência das colônias da Inglaterra na América: George Washington, Benjamim Franklin.

É digno de nota que dos 56 homens que assinaram a declaração de independência dos Estados Unidos, 50 eram maçons!

Na França, a queda da monarquia foi sustentada por ideais maçônicos (liberdade, igualdade e fraternidade) preconizados pelo Barão de Montesquieu, seguido tempos depois por outros maçons, entre eles, Rousseau, Voltaire, Diderot.

Mas porque falamos de maçonaria neste ensaio?

Porque foi ela, especificamente a maçonaria brasileira, que impulsionou a criação da primeira constituição da então monarquia brasileira, em 1824.

Consta nos anais maçônicos brasileiros, que uma reunião maçônica em 20 de agosto de 1822, comandada pelo Maçom Joaquim Gonçalves Ledo, emitiu-se uma declaração na qual a Maçonaria “concitava” o Príncipe Regente à imediata independência de Portugal.

Cópia da Ata dessa reunião foi entregue e lida por Dom Pedro I em 7 de setembro de 1822, influenciando a proclamação da independência do Brasil.

Nesse dia, às 16h30, às margens do pequeno Rio Ipiranga, na província de São Paulo, Dom Pedro I proferiu as célebres palavras:

“Laços fora, soldados! Pelo meu sangue, pela minha honra, juro fazer a liberdade do Brasil. Independência ou morte!”

Ocorre que logo após a declaração de independência, a maçonaria passou a exigir a redação de uma constituição própria do novo Estado brasileiro, fazendo com que Dom Pedro I, acuado, decretasse a proibição do funcionamento das Loja Maçônicas no Brasil.

Entretanto, as pressões continuavam e Dom Pedro I cedeu e autorizou em 3 de maio de 1823 a instalação da assembleia constituinte para redigir a primeira constituição do Império do Brasil.

Todavia, em 12 de novembro de1823, Dom Pedro I desfez a assembleia constituinte, outorgando a primeira carta magna no ano seguinte, em 25 de março de 1824.

Inaugurada a primeira constituição brasileira, lei máxima e de observância obrigatória para todos os cidadãos, seguiu-se outros textos constitucionais que foram outorgados e/ou promulgados, nos anos de 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1969 e, finalmente, 1988, cujo texto original, com diversas emendas constitucionais (mais de cem), vige até os dias atuais.

2. Brasil Colônia, Liberdade, Inovação.

A nossa Metrópole encontrava-se destroçada após sessenta anos de dominação do Reino de Portugal e Algarves pelo Reino da Espanha, devido a uma lamentável sucessão hereditária, que unificou os reinos, depois da morte – até hoje não explicada – de Dom Sebastião I, em 1578.

A potência ultramarina ficou subjugada pelos interesses da coroa espanhola até a sua libertação, em 1640, com a Guerra de Restauração, retardando o desenvolvimento das colônias portuguesas de além-mar, incluindo o Brasil.

A segunda metade do século XVII, até final do século XVIII, foram tempos de extrema exploração mercantil das colônias, com vistas à pronta recuperação econômica de Portugal.

Surge, então, em 1750, uma figura icônica na corte portuguesa: o Marquês de Pombal .

Içado à categoria de Secretário de Estado por Dom José I, o inefável déspota esclarecido – verdadeira iminência parda do regime – não titubeou em aumentar exponencialmente a pressão sobre as colônias portuguesas, especialmente a mais promissora, Brasil, tomando inúmeras medidas de subjugação e controle: fundou a Companhia das Índias Orientais, instituindo o monopólio comercial das colônias para a Matriz e vice e versa; proibiu, em 1757, a língua nheengatu e oficializou a língua portuguesa; extinguiu o regime de capitanias hereditárias em 1759; transferiu a sede da colônia brasileira de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763 e decretou a derrama em 1765 (impostos sobre o ouro minerado no Brasil).

Caiu em desgraça em 1777, quando da morte de seu protetor, Dom José I, e assunção ao Trono Real de sua filha, Dona Maria I, vindo ele a falecer em 1782.

Entretanto, os planos de dominação e as medidas “amargas” instituídas por Marquês de Pombal incentivou Dona Maria I a seguir suas intenções de severo controle das colônias, editando em 5 de janeiro de 1785, Alvará Real, impondo pesadas restrições às atividades industriais no Brasil.

Entre outras deliberações, o referido alvará proibia a fabricação de tecidos, utensílios domésticos e inúmeros outros produtos, impingindo ao Brasil, completa dependência de Portugal.

Não podemos olvidar que a Inconfidência Mineira foi sufocada em 1789, violentamente, por ordens de Dona Maria I, que temia a precoce independência do Brasil, caso fosse vitorioso aquele movimento insurrecional.

Anos mais tarde, já na regência de Dom João VI, em razão da debilidade mental de sua mãe, a Rainha, a história do Brasil colônia sofreu uma brusca mudança.

Em 1806, Napoleão Bonaparte em guerra com a Inglaterra, decretou o bloqueio continental, proibindo qualquer país europeu de comercializar com aquele país-ilha.

Portugal – que havia decretado sua neutralidade, assentiu aos ditames de Napoleão, mas, às escondidas, continuava comercializado seus produtos, especialmente os vinhos, com a Inglaterra e seus aliados, despertando a ira de Napoleão que determinou a imediata ocupação do pequeno território português e a prisão dos membros da corte.

Assim, na manhã de 29 de novembro de 1807, como narrou o escritor Laurentino Gomes, em sua magnífica obra “ 1808 – como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil” , a história de nosso país foi alterada abruptamente para sempre.

Dom João VI ao chegar ao Brasil, foi confrontado com uma dura realidade: “Os dois mundos que se encontraram no Rio de Janeiro em 1808 tinham vantagens e carências que se complementavam. De um lado, havia uma corte que se julgava no direito divino de mandar, governar, distribuir favores e privilégios, com a desvantagem de não ter dinheiro. De outro, uma colônia que já era mais rica do que a metrópole, mas ainda não tinha educação, refinamento ou qualquer traço de nobreza. Três séculos após o Descobrimento, o Brasil era uma terra de oportunidades imensas, típica das novas fronteiras americanas, onde fortunas eram construídas do nada e da noite para o dia.“

Ocorre que no Brasil não havia indústrias, por força do aludido Alvará Real de 1785.

As primeiras medidas tomadas pelo Príncipe Regente foi elevar o Brasil à categoria de Reino Unido, decretar guerra à França, a abertura dos portos às nações amigas e, principalmente, a revogação do Alvará Real de 1785.

No ano de 1809, editou a primeira lei de propriedade industrial, regulando os inventos dos cidadãos brasileiros e portugueses, incentivando a inovação com a criação de inventos úteis e necessários ao fomento da incipiente indústria brasileira, com vistas a suprir as deficiências gerais da corte e do novel Reino Unido.

Assim, a primeira lei brasileira de proteção às invenções, outorgando aos inventores 14 anos de privilégio, foi o Alvará Real de 28 de abril de 1809 , assinado por D. João VI, sendo portanto, na linha cronológica, a quarta lei no mundo a dar proteção aos inventores.

Portanto, no Brasil de então, não se poderia falar em livre iniciativa até a edição do Alvará Real de 1 de abril de 1808, que revogou o Alvará de 5 de janeiro de 1785 , que proibia a industrialização em nosso país.

Importante ressaltar que os colonos das treze colônias norte-americanas, antes da independência em 1776, padeciam dos mesmos problemas, em razão da atenção que a Inglaterra dava às guerras que travava na Europa, isto é, falta de assistência para a manutenção de armas, equipamentos, construção de navios e outros maquinários.

Logo, não tiveram alternativa senão desenvolver os seus próprios inventos e soluções técnicas, fator que contribuiu decisivamente para a independência tecnológica da Metrópole e a consequente independência política.

O mesmo, de certa forma, veio a ocorrer com o Brasil que, como dito acima, já era mais rico que a Metrópole, em 1808.

3. Constituição, Propriedade Industrial e Função Social.

Seguindo os passos da primeira Carta Magna brasileira , a função social da propriedade sempre foi objeto de muita atenção de nossos legisladores.

Já tivemos a oportunidade de comentar a função social da propriedade industrial em palestra proferida na OAB/SP em 2009 .

Naquela ocasião, externamos o seguinte pensamento:

“Essas criações intelectuais beneficiam tanto o seu criador, quanto à sociedade, pois trazem avanços tecnológicos e desenvolvimentos artístico, literário e científico que beneficiam toda coletividade.

Em contrapartida ao incremento tecnológico ou cultural, a sociedade outorga ao criador um privilégio, consistente na exploração exclusiva de sua criação, por um determinado período de tempo, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País.

Esses privilégios são considerados direito de propriedade e oponível “erga omnes”, tendo o seu titular o direito de usar, gozar e dispor livremente da obra, porém, condicionado essa fruição ao interesse social, ou a função social.

Como visto, o direito à propriedade encontra-se ordinariamente subordinado a sua função social, isto é, a sua serventia ou utilidade para a sociedade.

Pois bem. Na medida em que o Estado confere ao cidadão e à empresa um privilégio, a contrapartida natural seria o seu uso de forma racional e satisfatória aos interesses da sociedade.

Entretanto, não é o que ocorre em determinadas situações nas quais abusos de toda a natureza, perpetrados por titulares de direitos de propriedade industrial, são verificados, no Brasil e no exterior.

Com o fim da época das corporações de ofício e o nascimento do período do liberalismo econômico, acreditava-se que o mercado seria regulado por forças invisíveis, isto é, a mão invisível do mercado regularia a questão da oferta e da procura de bens e serviços.

Nesse sentido, dizia JHERING: A concorrência é o regulador espontâneo do egoísmo, pois o egoísmo do vendedor que exagera o seu preço é contido pelo de outro que vende a um preço menor, assim como o egoísmo do comprador que quer pagar muito pouco é refreado pelo de outro que oferece mais.

No entanto, a história mostrou que isso não funcionou, pois, surgiram em fins do século XIX, início do XX, imensos monopólios ferindo os interesses da sociedade, fazendo com que estudiosos passassem a considerar a imposição, pelo Estado, de limites ao exercício da livre iniciativa e da propriedade, e por corolário, da propriedade industrial.

A história da propriedade industrial registra um intrigante embate relatado por EDWIN BLACK , havido por pretenso abuso de direito de patentes, ocorrido em fins do século XIX entre Herman Hollerith – o inventor da máquina precursora do computador moderno – e o Governo dos Estados Unidos da América.

Por essa razão, o Estado deve estar atento a possíveis exageros e abusos do poder econômico cometidos por um concorrente em detrimento de outro ou mesmo de todo um mercado.

Como vimos, a permissividade constitucional representada pelo princípio da livre iniciativa não autoriza nem justifica abusos, isso porque, como lecionou CARLOS ALBERTO BITTAR, a potencialidade de iniciativa não é ilimitada, haja vista que a atividade empresarial deve se manifestar à luz de preceitos de moral, como a honestidade e a lealdade, pressupostos necessários ao regime da livre concorrência.

O direito de abusar e dispor livremente da propriedade, como era permitido e denominado em Roma antiga “Jus Abutendi”, já não encontrava mais abrigo no final do século XIX, razão pela qual sociólogos e filósofos dessa época se ocuparam em desenvolver teorias do conceito de “função social” da propriedade.

Logo, era imperioso que o Estado interviesse para limitar o direito de propriedade, subordinando o seu exercício ao cumprimento da função social, isto é, o fim a que se destina.

No ordenamento jurídico brasileiro, de há muito, verifica-se no plano infraconstitucional, diversas disposições acerca da função social da propriedade: (vide o art. 2° § 1°, da Lei 4.504/64 – Estatuto da Terra: a propriedade cumpre sua função social quando simultaneamente favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; mantém níveis satisfatórios de produtividade; assegura a conservação dos recursos naturais; observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem); função social da empresa (vide Lei 6.404/76 – Lei das Sociedades por Ações e Lei 11.101/05 – Lei de Recuperação de Empresas e Falência), nas quais o legislador subordinou os interesses particulares ao princípio da função social.

Especificamente na área da propriedade industrial, a lei de criação do INPI, Lei n° 5.648/70, assim dispunha:

Art. 2°
O INPI tem por finalidade principal executar, no âmbito nacional, as normas que regulam a propriedade industrial, tendo em vista a sua função social, econômica, jurídica e técnica, bem como pronunciar-se quanto à conveniência de assinatura, ratificação e denúncia de convenções, tratados, convênios e acordos sobre propriedade industrial.

A Lei da Propriedade Industrial, Lei n° 9.279 de 14 de maio de 1996, assim preconiza em seu artigo 2°:

Art. 2°
A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, efetua-se mediante:….

A função social foi erigida à categoria de princípio norteador quando inserido na carta magna de 1988, nos artigo 5° e 170:

Art. 5°

XXIII – a propriedade atenderá a sua função social

Art. 5°

XXIX – a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;

Art° 170
A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade

É digno de nota mencionar que o legislador pátrio não fez distinção entre as espécies de propriedade (material e imaterial), abarcando, portanto, ambas as espécies.

Logo, hodiernamente não se pode mais falar que o titular de direito de propriedade tem direito absoluto sobre ela, ao revés, esse direito é relativo, pois que está condicionado ao interesse social.

As normas constitucionais e infraconstitucionais acima citadas limitam claramente o exercício do direito de propriedade, facultando não só ao Estado, mas a qualquer pessoa com legítimo interesse, obter tutela contra eventuais abusos desses titulares, notadamente quando o exercício do direito na se presta a atender a função social ou ao interesse social.

Ademais, há o artigo 187 do Código Civil que capitula como ilícito civil, aquele que exerce direito, excedendo manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social.

Por fim, cumpre ressaltar a norma do art. 68 da Lei da Propriedade Industrial – que versa sobre a licença compulsória de patente – que é um exemplo de norma legal combativa do abuso do exercício do direito de propriedade industrial.

Em resumo, o uso e gozo da propriedade, seja ela material ou imaterial subordinam-se, hoje em dia, à sua função social, cuja inobservância, como vimos, transmuta-se para exercício abusivo de direito, sancionado pela lei civil brasileira.”

Como sói acontecer nos países desenvolvidos, a função social da propriedade avulta em importância, mas há que haver equilíbrio para não solapar o estímulo à inovação, mola propulsora do próprio desenvolvimento e geração de riquezas.

3.1 Constituição de 1824, outorgada em 25 de março de 1824.

Estamos prestes a comemorar os 200 anos da primeira constituição brasileira, outorgada por Dom Pedro I em 25 de março de 1824.

O texto da nossa primeira constituição – Constituição Política do Império do Brasil – foi elaborado por um Conselho de Estado que se baseou nos estudos e esforços dos constituintes eleitos para tal fim.

Como havia muitos interesses divergentes entre os constituintes (senhores de terra, comerciantes e aristocratas) e uma parte deles entendia que o Imperador deveria ter papel secundário no novo cenário nacional, limitando os poderes de Dom Pedro I, este dissolveu a assembleia constituinte, nomeando um Conselho de Estado para elaborar o texto final.

Essa constituição instituiu a Monarquia Hereditária Constitucional e o voto censitário, definindo 4 poderes: Executivo, Legislativo, Judiciário e o Poder Moderador, que dava a palavra final em questões de interesse do Império.

O jovem império já contava com uma lei da época da colônia que protegia os inventos, a Lei de 1809.

Pouco mais de 60 anos, em 1875, editava-se a primeira lei de marcas, por iniciativa do jovem advogado, Ruy Barbosa, que promoveu um embate judicial que entrou para a história da propriedade industrial como o caso Rapé Arêa Preta vs Rapé Arêa Fina (Parda).

A Constituição outorgada de 1824 previu o direito de propriedade e a garantia constitucional aos inventores, conforme se pode depreender do artigo 179, incisos XXII e XXVI:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

XXII. É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso, e emprego da Propriedade do Cidadão, será elle préviamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos, em que terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação.

XXVI. Os inventores terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas producções. A Lei lhes assegurará um privilegio exclusivo temporario, ou lhes remunerará em resarcimento da perda, que hajam de soffrer pela vulgarisação.

As constituições posteriores, igualmente, previram proteção aos inventos e às marcas, paulatinamente, assim como ao nome comercial (empresarial) e outros signos distintivos, como poder-se-á observar no item XXIX do art. 5° da Constituição de 1988.

Algumas delas erigiram os direitos de propriedade industrial à categoria de princípios, outras, como simples proteção infraconstitucional, como veremos a seguir.

3.2 Constituição de 1891, promulgada em 24/02/1891

Art.72 – A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes:
§ 25. Os inventos industriaes pertencerão aos seus autores, aos quaes ficará garantido por lei um privilegio temporario ou será concedido pelo Congresso um premio razoavel, quando haja conveniencia de vulgarizar o invento.

§ 27. A lei assegurará a propriedade das marcas de fabrica.

É digno de nota que a nova República se preocupou com o bem-estar do ex-imperador, Dom Pedro II, ao conceder no art° 7° das Disposições Transitórias da Carta Magna, pensão vitalícia. Confira-se:

Art 7º – É concedida a D. Pedro de Alcântara, ex-Imperador do Brasil, uma pensão que, a contar de 15 de novembro de 1889, garanta-lhe, por todo o tempo de sua vida, subsistência decente. O Congresso ordinário, em sua primeira reunião, fixará o quantum desta pensão.

3.3 Constituição de 1934, promulgada em 16 de julho de 1934

Dos Direitos e das Garantias Individuais

Art 113 – A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
18) Os inventos industriais pertencerão aos seus autores, aos quais a lei garantirá privilégio temporário ou concederá justo prêmio, quando a sua vulgarização convenha à coletividade.
19) É assegurada a propriedade das marcas de indústria e comércio e a exclusividade do uso do nome comercial.

Essa Carta Magna previu, pela primeira vez, a proteção ao nome comercial e às marcas de comércio.

3.4 Constituição de 1937, outorgada por Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937

Art 16 – Compete privativamente à União o poder de legislar sobre as seguintes matérias:

XXI – os privilégios de invento, assim como a proteção dos modelos, marcas e outras designações de mercadorias;

A Carta Magna de 1937, diploma de força outorgado por Getúlio Vargas, suprimiu, na prática, direitos e garantias individuais como narram os historiadores.

O Decreto n° 10.358 de 1942 determinou a suspensão de inúmeros direitos e garantias individuais, inclusive o direito à propriedade com a justificativa que o Brasil estaria em Estado de Guerra.

3.5 Constituição de 1946, promulgada em 18 de setembro de 1946.

Dos Direitos e das Garantias individuais
Art 141 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 17 – Os inventos industriais pertencem aos seus autores, aos quais a lei garantirá privilégio temporário ou, se a vulgarização convier à coletividade, concederá justo prêmio.
§ 18 – É assegurada a propriedade das marcas de indústria e comércio, bem como a exclusividade do uso do nome comercial.

3.6 Constituição de 1967, promulgada em 24 de janeiro de 1967

Dos Direitos e Garantias Individuais
Art 150 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 24 – A lei garantirá aos autores de inventos Industriais privilégio temporário para sua utilização e assegurará a propriedade das marcas de indústria e comércio, bem como a exclusividade do nome comercial.

3.7 Emenda Constitucional n° 1 de 17 de outubro de 1969

DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS
Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:
§ 24. À lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como a propriedade das marcas de indústria e comércio e a exclusividade do nome comercial.

3.8 Constituição de 1988, promulgada em 5 de outubro de 1988

DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXIX – a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;

Como se pode verificar, a atual Carta Magna, além da proteção aos institutos tradicionais da propriedade industrial, protege também outros signos distintivos, entre eles, a nosso sentir, o nome de domínio, o tradedress etc.

4. Conclusão

A Carta Constitucional de uma nação, em geral, forjada como muito suor, coragem e determinação de seus cidadãos, como sempre mostrou a história, confere o leque de princípios e garantias individuais a ser seguidos por todos sob sua égide, cuja inobservância deve ser coibida a qualquer tempo.

A proteção ao direito da propriedade, notadamente da propriedade industrial, especificamente, privilégios de invenção, modelos de utilidade, desenhos industriais e marcas, foi erigida à categoria de princípio constitucional desde a primeira Constituição, em 1824, e mantida na Carta Magna de 1988.

Observa-se que com o passar do tempo, a função social da propriedade encarna cada vez mais um papel importante para a sociedade, que através de seus representantes eleitos buscam editar leis que proporcionem o equilíbrio necessário entre o bem comum e a inovação.

Tags: constituição / propriedade industrial

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